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Precisamos falar sobre Ai Weiwei

Tem um tempo que li "O Que É um Artista?", de Sarah Thornton, e me impressionei com a disposição dela para interpelar artistas de várias partes do mundo - às vezes, os encontrando mais de uma vez - para que revelassem a mais pura e íntima visão sobre o próprio ofício. Missão árdua. Se há uma profissão difícil se definir é a do "fazedor de arte". Entretanto, Sarah conseguiu tratar de uma forma muito particular cada uma das experiências, seja se debruçando sobre os aspectos políticos e sociais das poéticas, ou apenas revelando processos de produção.

A autora tem trânsito livre entre nomes de peso da arte contemporânea, fato que a ajudou a conquistar uma lista de 33 entrevistados, entre eles a brasileira Beatriz Milhazes. Nem todos entraram no livro, editado no Brasil pela Zahar, enquanto alguns aparecem diversas vezes e em fases distintas, como o chinês Ai Weiwei, por quem Sarah faz questão de não esconder a simpatia.

Inevitavelmente, Sarah transfere a admiração que tem por Weiwei para seus leitores. Claro que ela não é gratuita. O chinês destoa de figurões como Damien Hirst e Jeff Koons, submersos num mercado de arte contemporânea glamouroso e de transações milionárias. Ativista, Ai Weiwei bate de frente com o governo chinês, já foi preso e proibido de sair do país por apoiar minorias e usar sua arte para fazer valer o direito à liberdade de expressão.

A mais recente polêmica envolvendo o artista foi o cancelamento de uma exposição na Dinamarca em protesto a aprovação de uma lei que permite confiscar os bens de refugiados.

Ele tem abraçado amplamente a causa dos refugiados com obras públicas, como a instalada recentemente na Alemanha, durante o Festival de Cinema de Berlim: 14 mil coletes salva-vidas usados por migrantes para chegar à Europa cobriam as colunas do teatro. É... Weiwei anda rendendo assunto de sobra para a imprensa e o meio artístico. No Brasil, já é grande a expectativa pela exposição que o artista promete para março de 2017, na galeria Oca, em São Paulo.

Mas eis que enquanto eu me deleitava com notícias baphônicas do Weiwei, por muito pouco perdi uma rápida passagem dele por Paris. Preciso confessar que ainda não me acostumei com esse lance de estar numa cidade onde tudo acontece - às vezes tudo ao mesmo tempo. Li estes dias uma definição que casou perfeitamente com o que eu sinto nestes últimos meses, algo sobre "ter a sempre a impressão de que em Paris você está perdendo de fazer algo muito legal, mesmo quando você já está fazendo algo muito legal". Acho que é mais ou menos isso: a agonia por não dar conta de estar/aproveitar todas as oportunidades.

A minha sorte foi que a galeria Le Bon Marché, que estava promovendo a exposição do Weiwei em Paris, resolveu prorrogar a visitação até 15 de março, e eu pude, enfim, conhecer outra face linda do artista: a valorização das suas raízes.

Este é o Lu, um peixe que se parece com um boi de cauda e barbatanas - reza a descrição

O ambiente da exposição daria uma postagem à parte. Le Bon Marché é uma loja de departamentos de marcas caras que vende a imagem de mecenas das artes. Chega a ser meio estranho entrar num lugar onde eu nada poderia consumir só para admirar o trabalho de um artista tão afiado com as questões sociais. Entretanto, me senti absolutamente confortável durante a visita.

Batizado de Heluo, esta criatura é um peixe com uma cabeça e dois corpos

A série "Er Xi, Air de Jeux" é composta por 22 criaturas fantásticas do imaginário chinês, grandiosas e leves - graças ao uso de varinhas de bambu e papel seda -, todas reinterpretadas por Weiwei. As esculturas monumentais revelam a habilidade e, sobretudo, paciência oriental. Um capricho que nem sei se as minhas fotos são conta de mostrar.

As esculturas flutuam sobre as seções e ganham uma nova perspectiva a cada novo lance de escadas rolantes. Como a galeria não estava cheia, deu para aproveitar tranquilamente a vista dos parapeitos.

Vista do último andar da galeria

Le Bon Marché também é decorada com telas e esculturas de outros artistas, entre nomes reconhecidos e emergentes. As obras estão espalhadas por todos os setores. Vale uma visita! Ah, e a entrada é gratuita ;)

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