Um encontro com o controverso Polanski
- Edson Burg
- 18 de abr. de 2016
- 3 min de leitura
Há OITO ANOS escrevi essa matéria pro “Anexo” e pro finado “Pipoqueira” no 75º aniversário de Roman Polanski. A ideia de que a vida do diretor de “Chinatown”, “O Bebê de Rosemary” e “O Pianista” – para ficar apenas nas suas três maiores obras-primas – renderia um ótimo filme permanece. E as recentes declarações um tanto misóginas de Polanski acerca de seu último filme só tornam a coisa ainda mais pungente.
Foi com esse pensamento de ver uma figura, no mínimo, curiosa, que me dirigi ao Cinéma Les Fauvettes, em Paris, para acompanhar a masterclass de Polanski, parte de uma intensa programação com filmes e debates sobre a carreira do diretor. Chamou a atenção, em um primeiro momento, o seu bom humor e o gosto dele em conversar com o público – parecia tudo, menos uma coisa protocolar do tipo “estão me pagando, eu vim”. Polanski realmente demonstrou ter vontade de debater seus filmes com uma plateia que, em sua maioria, nem era nascida no seu auge nos anos 1970.

Polanski durante uma de suas inúmeras filmagens
Sem surpresas, a conversa foi quase que exclusiva para quem conhecia substancialmente sua filmografia. Só quem já viu “Chinatown”, por exemplo, conseguiu ter a noção exata do que Polanski disse sobre o “final feliz triste” deste filme que ele se inspirou diretamente em “Odd Man Out”, de 1947. O longa-metragem de Carol Reed, aliás, é uma das quatro referências obrigatórias que Polanski indicou como grandes inspirações em seu modo de pensar o cinema – as outras são o “Hamlet” (1948), de Laurence Olivier; “Oito e Meio” (1963), de Fellini; e “Cidadão Kane”, de (1946), de Orson Welles, provando que um clichê só vira um clichê porque é realmente eficiente.
Destes, e de outros filmes, Polanski destacou algo até um tanto óbvio em um primeiro momento: o bom filme é aquele que começa e termina com uma cena de impacto. Não por acaso, o diretor exibiu a abertura de “Macbeth” (1971), talvez o grande fracasso de crítica e público de sua carreira, mas o único filme (segundo os organizadores) que ele fez absoluta questão que estivesse no ciclo no Les Fauvettes. Trata-se de uma composição belíssima, quase uma declaração de amor à obra de Shakespeare por sua importância temática e patética, em um filme do qual, segundo ele próprio, Polanski se orgulha dos críticos norte-americanos não terem gostado enquanto os britânicos amaram.
Cena de abertura do filme "Macbeth"
Sobre a conturbada vida pessoal, a perseguição que o franco-polonês Polanski conviveu na infância durante o Holocausto nazista, a admiração pelo satanismo, a trágica morte da esposa Sharon Tate, a condenação por ter feito sexo com uma menina de 13 anos nos EUA em 1977 (o que o impede desde então de voltar ao país, aliás) e as recentes polêmicas? Nada. Aliás, um pequeno momento, quando Polanski afirmou que “O Pianista” quase foi seu último filme, quando ele percebeu ter alcançado uma obra exatamente no ponto em que desejava – para ser mais exato, “todos os meus filmes me levaram até 'O Pianista’”. Tal produção, aliás, que ganhou merecidamente quase todos os prêmios possíveis do cinema mundial (Oscar, Bafta, Cesár, Goya, etc.).

Adrien Brody e Polanski no set de "O Pianista"
Uma declaração que resume o quão genial é Roman Polanski. E, ao mesmo tempo, revela e deixa obscura uma personalidade bastante controversa.
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